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Como você denomina os fundos quantitativos? Black box ou glass box?

Em tempos de chat-GPT e inteligência artificial, frequentemente associa-se estratégias quantitativas a black box, ou caixas pretas, que supostamente executam estratégias desconhecidas geradas por grandes modelos de linguagem, redes neurais ou outras tecnologias sofisticadas. Somado a isso, algumas gestoras, visando glamourizar seus modelos, utilizam-se de linguagem técnica e retórica prolixa para aumentar o mistério em torno das estratégias quantitativas utilizadas. Apesar de fazer uso das principais tecnologias disponíveis para otimização de processos e pesquisa, bem como para a análise de dados e implementação de estratégias, na Pandhora temos uma visão diametralmente oposta: entendemos que os modelos quantitativos devem ser extremamente transparentes na relação homem-máquina. Isso significa que os gestores e investidores devem entender detalhadamente quais as estratégias sendo implementadas pelas máquinas para gerar retornos. De fato, as principais estratégias utilizadas pela gestora visam implementar fenômenos geradores de retornos, ou prêmios de risco, em finanças, amplamente documentados na literatura acadêmica. Alguns desses papers acadêmicos inclusive resultaram em prêmios Nobel para seus autores, como é o caso de Eugene Fama e Keneth French que escreveram, dentre outras análises, o aclamado "The Cross-Sectional Analysis of Expected Stock Returns" (1992)

Após uma trajetória de 7 anos no mercado financeiro brasileiro, a Pandhora atravessou distintos períodos de interesse dos investidores em relação aos fundos quantitativos. É inegável o avanço no "financial deepening" que vivenciamos há algum tempo. Em 2016, quando iniciamos nossa jornada, discutir sobre gestoras que adotavam tecnologia para a gestão de fundos era quase como uma pregação que por vezes gerava reações esdrúxulas. Antes de adentrar nas particularidades de nossas estratégias e como buscamos gerar retornos, era imprescindível explicar o histórico, escopo global e vantagens da gestão sistemática. Embora o mercado atualmente demonstre maior compreensão, reconhecemos que ainda há um extenso caminho a percorrer para que esse tipo de gestão seja plenamente entendido e adotado no cenário financeiro local. Até porque, há ainda uma lacuna grande entre a penetração das estratégias na indústria de fundos local comparada com a indústria global.

Desde o início e até os dias de hoje, percebemos que um dos receios mais marcantes dos alocadores é de a gestão quantitativa ser descrita como uma "black box", termo amplamente usado no exterior para descrever algo incompreensível. Em 2019, durante nossa participação em um evento para gestores quantitativos globais em Nova York, tivemos a oportunidade de ouvir Donald Sussman, um experiente gestor dos EUA e fundador da Paloma Partners em 1981. Durante sua apresentação, Sussman compartilhou uma perspectiva interessante: apesar do mercado enxergar os gestores quantitativos como caixas-pretas, na verdade somos "glass boxes" - caixas de vidro transparentes. Essa frase nos marcou por enxergar nessa interpretação, uma visão muito semelhante à nossa. É evidente que existe uma busca incessante por inovação e refinamento nas tecnologias e estratégias utilizadas na indústria quantitativa. Ao mesmo tempo, é altamente improvável o nascimento de técnicas e conceitos que tentam reinventar a roda. Em grande parte, os fenômenos explorados por esses modelos devem ser embasados conceitualmente e amplamente testados estatisticamente.

A transparência na abordagem quantitativa deriva do fato de que, ao final do dia, é necessário compreender precisamente quais dados, variações e ativos influenciaram um fundo sistemático a tomar a decisão de comprar ou vender um ativo específico. Ao contrário da gestão tradicional e discricionária, onde essa clareza muitas vezes falta. Com base na experiência de Sussman e em nossas interações com diversos alocadores, observamos que muitos concordam que já se depararam com situações em que não havia um racional claro para uma determinada ação do gestor - seja uma operação lucrativa ou uma perda, frequentemente baseada apenas no instinto do gestor. Instinto esse que algumas vezes leva a lucrativas operações, nós respeitamos e admiramos inúmeros gestores do mercado que realizam esse tipo de ação. Mas, no final do dia, são raros os casos de modelos misteriosos onde a máquina se torna tão avançada e inteligente que supera até mesmo a compreensão dos homens que as programam. Pelo menos até agora, e ainda há tempo para que isso de fato ocorra, embora há quem argumente que isso é inevitável.

É claro que divulgar de forma aberta as minúcias de nossas estratégias seria entregar ao mercado nosso diferencial. Mas reiteramos que, apesar de decidirmos não ligar a luz e mostrar dentro da caixa de vidro, nossos processos e métricas são tão estruturados que isso seria possível. Por isso a leitura dos sinais é fria e os gestores quantitativos têm fama de conseguir performar em cenários onde grande parte da indústria não performa. Mesmo assim, os gestores quantitativos também podem ter períodos de má performance, relacionado ao tipo de estratégia que carregam.

A Pandhora, neste mês, chegou a um momento onde todos seus fundos passaram o CDI, algo que tem sido um desafio para todos os gestores com o juros brasileiro como benchmark. Tudo isso com capacidade de ser explicado na vírgula e sem causar receio ao investidor.